Tuesday, November 30, 2010

Futebol vs Futsal

Boas (é bom voltar a escrever!),
O que falta em inteligência no Futebol do Sporting, é esbanjado em emoção em Futsal!
No último fim-de-semana tive o privilégio de assistir às duas partidas do Sporting (em Futebol e Futsal), contra duas grandes equipas: O F.C. Porto e o "El Pozo" Múrcia (Campeão Espanhol de Futsal). Tive também o previlégio de ver uma grande primeira parte de um jogo de Futebol, e um GRANDE jogo de Futsal a contar para o apuramento para a "Final 4". E o que faltou em inteligência à equipa de futebol do Sporting para na 2ª parte dominar e vencer o Porto, a equipa de Futsal esbanjou em coração e emoção. E foi ver a resposta dos adeptos.
Foram 40 minutos (apesar de ter sido mais tempo) de puro envolvimento com a equipa, de puro "sportinguismo". E sempre que o apoio baixava um pouco o volume, lá voltavam os jogadores de Futsal a puxar pelo público.... Quer a jogar, quer no banco, foi um verdadeiro "banho" de Sportinguismo!
E é isto que falta à Equipa de Futebol do Sporting: Paixão e envolvência com o público!
Sou e sempre serei Sportinguista, mas este Domingo, no Futsal, percebi claramente que ser "Sportinguista, é ser diferente!" E para melhor...
Orgulhosamente,
Eu

Wednesday, October 28, 2009

Procura-se um/uma "Amante"

"Muitas pessoas têm um amante, e outras gostariam de ter um. Há também as que não têm, e as que tinham e perderam. Geralmente são estas últimas que vêm ao meu consultório para me contar que estão tristes ou que apresentam sintomas típicos de insónia, apatia, pessimismo, crises de choro, ou as mais diversas dores. Elas contam-me que as suas vidas correm de forma monótona e sem perspectivas, que trabalham apenas para sobreviver e que não sabem como ocupar o tempo livre. Enfim, são várias as maneiras que elas encontram para dizer que estão simplesmente a perder a esperança. Antes de me contarem tudo isto, já tinham estado noutros consultórios, onde receberam as condolências de um diagnóstico firme: "Depressão", além da inevitável receita do anti-depressivo do momento. Assim, depois de as ouvir atentamente, eu digo-lhes que elas não precisam de nenhum anti-depressivo. Digo-lhes que o que elas precisam é de um Amante!É impressionante ver a expressão dos olhos delas ao receberem o meu conselho.
Há as que pensam: "Como é possível que um profissional se atreva a sugerir uma coisa destas?!".Há também as que, chocadas e escandalizadas, despedem-se e não voltam nunca mais. As que decidem ficar e não fogem horrorizadas, eu explico-lhes o seguinte: “Amante é "aquilo que nos apaixona". É o que toma conta do nosso pensamento antes de adormecermos, e é também aquilo que, às vezes, nos impede de dormir. O nosso Amante é o que nos mantém distraídos em relação ao que acontece à nossa volta. É o que nos mostra o sentido e a motivação da vida.”Às vezes encontramos o nosso amante no nosso parceiro, outras vezes,em alguém que não é nosso parceiro, mas que nos desperta as maiores paixões e sensações incríveis. Também podemos encontrá-lo na pesquisa científica ou na literatura, na música, na política, no desporto, no trabalho, na necessidade de nos transcendermos espiritualmente, numa boa refeição, no estudo, ou no prazer obsessivo do nosso passatempo preferido.Enfim, Amante é "alguém" ou "algo" que nos faz "namorar" a vida e nos afasta do triste destino de "ir vivendo". E o que é "ir vivendo"? "Ir vivendo" é ter medo de viver. É vigiar aforma como os outros vivem, é o deixarmo-nos dominar pela pressão, andar por consultórios médicos, tomar remédios multicoloridos, afastarmo-nos do que é gratificante, observar decepcionados cada ruga nova que o espelho nos mostra, é aborrecermo-nos com o calor ou com o frio, com a humidade, com o sol ou com a chuva. "Ir vivendo" é adiar a possibilidade de viver o hoje, fingindo contentarmo-nos com a incerta e frágil ilusão de que talvez possamos realizar algo amanhã. Por favor, não se contentem com "ir vivendo". Procurem um(a) amante, sejam também um amante e um protagonista da vossa vida. Acreditem que o trágico não é morrer, porque afinal a morte tem boa memória e nunca se esqueceu de ninguém. O trágico é desistir de viver, por isso, e sem mais delongas, procurem um amante. A psicologia, após estudar muito sobre o tema, descobriu algo transcendental: "Para se estar satisfeito, activo, e sentirem-se jovens e felizes, é preciso namorar a vida".

Dr. Jorge Bucay

Tuesday, June 09, 2009

O «senhor» do Adeus


O «Senhor do Adeus»

Cabelo branco, ondulado, gabardine, cachecol, roupa clássica, óculos pretos.... Esta é a imagem de marca de João Manuel Serra, o “Senhor do Adeus”.
Contando já com 78 anos, “Senhor” é coisa que detesta que lhe chamem, preferindo ser conhecido como “Ti João”.


Por Pedro Miguel Silva
Esta “missão” começou há sensivelmente nove anos, depois da morte da mãe, com quem vivia. Precisava de se distrair e incomodava-o a ideia de estar sozinho em casa. Um dia, aconteceu! Já reparara que as pessoas o cumprimentavam sem razão nos centros comerciais e, sem saber como nem porquê, surgiu o primeiro aceno na estrada. Depois veio outro e outro, e o caso virou fenómeno.
Quem o quiser ver a acenar e cumprimentar, basta deslocar-se aos seus locais de “trabalho”: o topo da Avenida da Torre de Belém ou o Largo do Saldanha.
Enquanto que no topo da Avenida da Torre de Belém o pode encontrar todos os dias de semana, de segunda a sexta, das 18h às 20h, e sem qualquer folga, já no Saldanha é mais complicado, uma vez que não tem hora certa de lá estar!
E entre muitas buzinadelas e acenos, aceitou contar-nos a sua história, apesar de confessar que não sabe bem como tudo começou: «Começou já há muitos anos, depois de a minha mãe ter falecido, passei a andar mais na rua sozinho. Começou em certos sítios: no Centro Comercial das Amoreiras e no Colombo».
«Rapaziada, pessoas simpáticas que não sei porquê, uma empatia talvez qualquer que haja que eu não sei explicar, não sei explicar mesmo...e que realmente começaram a acenar ou a dar as boas noites, boas tardes e isso tudo...e eu comecei a achar que realmente estava a tomar um certo incremento fora do vulgar. Quer dizer, também talvez tenha ficado um bocado promovido porque pouco depois de eu ter começado a fazer isto, uma equipa da televisão e o jornalista Luís Osório, muito conhecido e muito bom, que estava a fazer um programa na RTP2 [e] que era o Zapping. Faço isto não é para me exibir, para me promover... Faço isto porque gosto de estar na rua, é na rua que eu gosto de estar. Estar a acenar às pessoas e a ter esta comunicação.»
João nasceu no seio de uma família muito rica. Até aos dez anos, viveu num enorme palacete da Rua Tomás Ribeiro, cobiçado mesmo pelo próprio Gulbenkian: «Que saudades tenho desse tempo... A casa estava sempre cheia de família e amigos...».
Mimado desde bebé, fez a instrução primária toda em casa, com um professor particular, pois no primeiro dia de aulas no Colégio Parisiense chorou tanto que os pais não tiveram coragem de o mandar de volta.
«Fui criado numa redoma de vidro», confessa, explicando: «Naquela época era tudo muito diferente, havia muitos tabus.». Depois do divórcio dos seus progenitores, quando tinha 13 anos, João foi morar para o Restelo com o pai. Por ele, inscreveu-se em Direito, mas depressa desistiu por ser «muito chato».
Depois de uma igualmente curta passagem pelo curso de Histórico-Filosóficas, o pai, «que não sabia que fazer» com ele, mandou-o para Londres com o irmão: «Foram três anos fantásticos. Tinha um grupo de amigos fabuloso, com quem viajei imenso. Teria lá ficado, se não fosse tão agarrado à família...». Sem quase pôr os pés nas aulas, regressou a Portugal e, depois da morte do pai, pouco tempo depois, foi morar com a mãe, de quem não se separou até ao último dia da sua vida: «Viajámos muito os dois. Todos os anos íamos a Paris e Madrid. Conheço a Europa inteira, excepto a Grécia...».
Isto do dizer adeus é coisa séria para o “Ti João” e quer faça chuva, quer faça sol, ele lá está…: «Não gosto de faltar a este meu hábito que me faz tão bem, não é? Não é um emprego, é uma ocupação, porque...é muito bom para mim porque, já vê...também não é tudo rosas e também tenho os contras, que é, por exemplo, a minha idade já...aguentar o Inverno, não é? O frio, porque tenho de me agasalhar muito... Se está a chover é uma chatice! Eu prefiro o frio à chuva, porque agasalho-me muito para o frio e não, e pronto… Agora chuva é muito chato, estar com o chapelinho de chuva...é claro, se for aquela chuva torrencial também tenho que me abrigar e isso tudo. Mas, de contrário, já estou habituado, sabe, já estou habituado a isso tudo. De maneira que já…já aguento um bocado, realmente, o Inverno…Tenho aguentado este Inverno, que foi tão frio, tão rigoroso, não é…».
E nem quem o considera maluco o afecta... : «Às vezes há uma ou outra pessoa ordinária que pode dizer: “maluco”, ou isto, ou aquilo… Como sou compensado pela grande maioria das pessoas que me saúdam de uma maneira muito bonita, estou me nas tintas para esses tipos, completamente! Uma pessoa de 78 anos, que está metida em casa só a ver televisão e de pantufas…é muito chato, não é?… Portanto, assim, eu mexo-me, faço exercício, tomo ar, comunico…para mim é um remédio, pronto, não podia ser melhor.»
É o remédio que lhe permite disfarçar a solidão que o consome e o faz olhar para o passado com arrependimento, por não ter ousado viver a sua vida em vez da dos outros.
No baú dos sonhos perdidos, jaz o curso que não tirou, o trabalho que nunca fez, os filhos que não teve e, pior, o grande amor que nunca conheceu:
«Sinto-me só. Incompleto. Como se algo estivesse a falhar.»

Friday, May 29, 2009

Adopção por casais homossexuais

Actualmente, está em debate na praça pública a questão da legalização da adopção de crianças por parte de casais homossexuais.
Em Portugal, este tema é quase assunto tabu, pois a união homossexual ainda não é aceite pela Constituição e pela sociedade em geral.
Mas fugindo a esse tema polémico, e pensando somente pelo lado das crianças, será que a adopção por parte de um casal homossexual permite um desenvolvimento social saudável?
O facto de se ter dois pais ou duas mães poderá permitir que uma criança possa crescer num ambiente saudável quer em casa, quer no meio envolvente (escola, grupos de amigos, sociedade em geral)?
É inegável que uma criança para se desenvolver física e psicologicamente necessita do apoio de uma mãe e de um pai, coisa que um casal composto por pessoas do mesmo género (independentemente de ser masculino ou feminino) não poderá oferecer a um jovem. As figuras paternais e maternais são essenciais para este desenvolvimento e maturidade. É inegável que quer os homens, quer as mulheres têm características intrínsecas que são necessárias conjugar para permitir a educação e maturidade de um jovem, algo que num casal do mesmo género deixa de ser possível, uma vez que será diferente a maneira de transmitir certos valores e de educar uma criança.
Depois, há toda uma vertente social. Uma criança, na escola e no seu grupo de amigos, que tenha dois pais ou duas mães será sempre alvo de descriminação e gozo por parte dos restantes pares. Apesar da homossexualidade ser uma opção íntima de cada um, as crianças não devem ser expostas à partida a uma situação que não é de todo natural.
A sociedade portuguesa tem uma cultura fechada, ainda muito ligada à Igreja, que não permite que casais homossexuais sejam bem aceites e integrados. Se a possibilidade de adopção prosseguir, aqueles que serão os principais “sofredores” com esta decisão serão sempre os jovens que forem adoptados.
Mais uma vez repito que a homossexualidade é uma questão íntima de cada um, mas se a união homossexual é ainda ilegal em Portugal, deve uma criança ser entregue a um grupo de pessoas sem relação formalizada? É uma questão íntima enquanto não interferir obrigatoriamente na vida de outra pessoa; a partir desse momento deixa de o ser.
Se a homossexualidade em Portugal não é aceite, é natural que a relação esteja escondida de todos os “olhares” da sociedade. Uma criança não deve ser sujeita a esta situação desconfortável.
Esta é uma guerra que está a escolher erradamente os alvos. É uma procura de igualdade por parte dos homossexuais que se esquecem que o que está em discussão não são os seus interesses, mas os desejos e vontades de crianças inocentes.
Há também toda uma vertente ética que não pode ser descurada. Dois homens ou duas mulheres nunca foram feitos para procriar. Os seus organismos complementam-se (o do Homem e o da Mulher), daí que esta adopção vem mudar todo o conceito de criação e desenvolvimento da Humanidade. Se se passar a aceitar esta adopção, a própria humanidade estará em causa, no que diz respeito a uma questão de procriação.
A questão que deveria ser discutida não deveria ser a hipótese de casais homossexuais poderem adoptar, mas sim se as crianças estão preparadas para serem adoptadas por um casal homossexual.
A pergunta que deve ser analisada e debatida no tema da adopção por casais homossexuais é: Qual é a finalidade última desse acto?
Será uma questão relacionada com o proporcionar uma vida melhor a inúmeras crianças que estão acolhidas em instituições ou será uma luta pela procura de direitos e oportunidades iguais para os casais homossexuais?
Pelo que me tenho apercebido pelos argumentos “a favor”, parece-me que, apesar de existir alguma preocupação com o bem-estar das crianças, o argumento maior recai sempre no dos direitos e oportunidades iguais para os homossexuais, coisa que, de longe, deverá ser a tese mais válida.
E especialmente em Portugal, antes de se debater e discutir esta questão, há que definir legalmente qual o papel e “legalidade” da homossexualidade no nosso país.


Quem me conhece deve estar a pensar: "não acredito que ele tenha escrito isto...!!!"
Pois é! Escrevi, mas fui obrigado a tomar uma posição contrária aquela em que acredito! "E esta, hein?"

A maior dificuldade que senti na criação e elaboração deste texto argumentativo foi ter a capacidade de afastamento da minha posição que assumidamente é a favor da adopção de crianças por casais homossexuais.
Confesso que só após alguma pesquisa na internet estava habilitado de alguns argumentos para poder defender a posição “contra”.
Mas aceitei o desafio do professor de me colocar no lado oposto à opinião que defendo e considero que é uma enorme mais-valia no meu crescimento argumentativo.
Deu-me a capacidade de me colocar no outro lado da questão e ver o debate de um prisma completamente diferente, coisa que até agora não tinha feito.
É muito importante possuirmos este olhar isento e de fora da nossa opinião, para podermos procurar mais informação e para podermos também criar uma opinião fundamentada e com argumentos válidos.
Foi o superar da razão em prol do coração, coisa que, para uma pessoa emotiva e impulsiva como eu, nem sempre é fácil.
Houve um pensar profundo nos argumentos e até mesmo nas palavras a utilizar para não deixar qualquer dúvida da minha posição. Depois, foi o ler e reler para me aperceber se a minha opinião “pró-adopção” em algum momento estava espelhada no texto.
Outra questão curiosa, e que deu alguma luta e até mesmo prazer, foi o “desconstruir” preconceitos já estabelecidos, tentando formular opiniões e argumentos no sentido contrário àquilo que acredito.

Wednesday, April 29, 2009

“Da morte também não tenho medo”

O coveiro de Mioma, uma aldeia do distrito de Viseu, explicou-nos o que o levou, nos dias de hoje, a escolher esta profissão. Exerce-a há já oito anos e já não quer ter outra carreira. Afirma não ter medo, mas já se assustou em determinadas situações.

Armando Figueira Cerdeira, de 66 anos, trabalhou durante 28 anos na Guarda Nacional Republicana, em Lisboa, e ainda em Coimbra, sempre ligado à Cavalaria. Após se reformar e se ter dedicado à agricultura durante algum tempo, surgiu-lhe um enorme desafio: ser o coveiro da sua freguesia.
O convite apareceu quando o coveiro de então faleceu e mais ninguém queria fazer o trabalho.
Armando ganhou coragem e, apesar de inicialmente não ser o trabalho que mais lhe agradasse, aventurou-se.
Ao início, a família não ficou muito satisfeita com aquela decisão, mas agora já se mentalizou: “era um trabalho que alguém tinha que fazer”.
Para Armando, as qualidades necessárias para se ser um bom coveiro é saber trabalhar com a enxada e coragem para lidar com este estilo de vida, até porque já passou por muitas situações e algumas “não se devem nem podem contar”, mas confessou que teve de ter um grande estômago.
Em tom de brincadeira, os amigos já o “acusaram” de roubar sapatos e casacos a mortos, mas rejeita essas calúnias: “se ainda fosse uma carteira cheia de dinheiro”, ironiza dizendo que ainda pensava duas vezes...
Confessa que já se assustou em algumas situações, mas afirma que: “da morte também não tenho medo!”
No entanto, admite que para se ser coveiro não é necessária nenhuma vocação, mas sim “uma pessoa saber o peso do trabalho, e o indivíduo tem que ter consciência daquilo que anda a fazer”, uma vez que é um trabalho doloroso e é necessário ir a contar com qualquer coisa que apareça.
No fim de contas, para Armando Cerveira, ser Coveiro “é deitar terra para cima”! E isso é o que lhe custa menos: “a mim não pesa nada...não pesa nada”. Hoje não queria ter mais nenhuma profissão: “é aquela que tenho e não quero outra”, afirma o Coveiro de Mioma...
Armando já fez funerais de graça, mas não o faz para todos. Fez um porque tinha consideração pela família, o que não quer dizer que um dia não o volte a fazer se houver alguém que esteja necessitado e que não tenha dinheiro: “é fazer uma obra de caridade”!

Friday, March 20, 2009

Vidas Forçadas


Viver é conhecer....conhecer é estar...estar é viver!

Esta é uma frase que descreve a nossa protagonista quase na perfeição.

Shahin é uma mulher com 24 anos, de sorriso enigmático moldado pela multi-culturalidade, que vagueia pela cidade de Lisboa com a naturalidade de quem conhece e pertence àquele local e de quem faz de todo o mundo a sua casa. O brilho nos seus olhos é a certeza de quem está feliz por ali estar e o seu à vontade só parece estranho para quem não a conhece e não sabe nada do seu passado. Olha para as coisas com “olhos de ver”, com a curiosidade de quem tenta encontrar diferenças e semelhanças com aquilo que já conhece, com o que não conhece mas espera um dia vir a conhecer, e com aquilo que já viveu e com todos os lugares onde já esteve...
As suas recordações vão longe...tão longe quanto a própria geografia o possa permitir.
Na realidade, Portugal é um país que lhe agrada pelo seu tempo fantástico e pela cultura de partilha de experiências existente! Passear pela capital portuguesa e perceber que esta cidade é uma miscelânea de culturas pode parecer normal, mas para uma cidadã iraniana à partida pode causar estranheza....Porém Shahin, pelo que já viveu e pelo que já experimentou, tem no sangue uma mistura de culturas, um conjunto de sonhos que, de certa forma, a faz identificar-se com Lisboa.
Apesar de ser só mais um país no seu percurso de vida, Portugal acaba por marcar Shahin de uma forma que ela não esperava! É o país que complementa aquilo que ainda não viveu...Fazer Erasmus e estudar neste país é o concretizar de um sonho de estudar fora da Finlândia e faz com que ela evolua quer ao nível pessoal, quer ao nível profissional.
Agora Shahin sente-se mais preparada para, também ela, poder mudar o mundo com o seu curso em Jornalismo e mais completa no seu interior enquanto pessoa. Já viveu o calor humano deste país que, por tradição, recebe bem todos os que por cá passam e quer voltar à Finlândia e mostrar que a frieza finlandesa pode e deve “aquecer”! E numa simples conversa de café a sua vida ganhou voz e as experiências ficaram à flor da pele:


Pegar nas malas e partir...

Foi a isto que foi obrigada a minha família [a família Doagu] quando em 1987 tivemos de abandonar o Irão. O Objectivo? Simplesmente o de procurar uma vida melhor, como qualquer outro Curdo! Para trás fica todo um passado, toda uma história, toda uma vida. Nunca é fácil abandonar a terra que nos viu nascer e eu, a filha pequenita, nem me estava aperceber do que se estava a passar...
Afinal, o facto de se ser Curdo
[1] e pertencer a uma minoria não aceite e respeitada levou a que os meus direitos humanos fundamentais e especialmente os dos meus pais, não fossem tidos em conta... Chegámos mesmo ao extremo de não podermos sequer falar publicamente na nossa língua materna.
Não é fácil viver num país onde está instaurada uma “guerra santa”... Onde, apesar de nós, os curdos, termos a hipótese de expressar a nossa identidade cultural livremente, os direitos de governo e auto-administração são-nos completamente negados.
Além do mais, tinhamos a vontade e o desejo (quase impossível) do reconhecimento do nosso Curdistão enquanto país independente.


A Constituição do Irão é baseada na lei islâmica, pelo que tem efeitos na vida comum de qualquer cidadão que habite no Irão e o dia-a-dia da família Doagu era regido por essas leis. Assim, tinham que seguir o exemplo da maioria das pessoas e rezar cinco vezes por dia. Há também alguns períodos do ano em que quase todos dedicam à religião, sendo disso exemplo o Ramadão e Dia de Noruz[2] .
Para Shahin, a grande diferença entre o Irão e os países europeus reside no aspecto físico, desde a postura até ao vestuário. As mulheres têm de usar burka a cobrir a sua cabeça e têm de esconder o seu corpo quase na totalidade. Também por uma questão cultural as raparigas não devem passear sozinhas na rua. Outro exemplo que Shahin destacou pela negativa é o processo de reserva num hotel, em que os homens e mulheres não podem fazê-lo juntos se não forem parentes ou já um casal efectivamente casado. Dessa forma, segundo a opinião de Shahin, o Estado do Irão acaba por controlar tudo o que for pré-nupcial. A dicotomia entre o coração e a razão são uma constante para esta jovem.

Sejam quais forem os motivos, o nosso cordão umbilical está sempre preso à terra que nos viu nascer e quando nos obrigam a cortar esse cordão umbilical sangramos. Sangramos com uma dor que pode não ser vísivel, mas que deixa marcas internas profundas e irreversíveis. E eu, ainda não tendo noção do que se passava, ficava já com essas marcas.

O próximo destino foi a Turquia: não por muito tempo, nem deixando boas recordações. Seguiram o rumo da maioria do povo curdo... pois sensivelmente metade do povo curdo mora na Turquia, representando cerca de 20% do total da população que habita neste país. Quando Shahin compara a Turquia com a Europa verifica que é um país em tudo semelhante aos restantes europeus, sendo que as maiores diferenças dizem respeito à religião. Na Turquia a maioria da população é muçulmana e certos actos de afecto em público não são aceites como na Europa. A liberdade europeia que tanto gosta e admira, na Turquia é uma impossibilidade.

Os conflitos entre os turcos e os curdos existe desde sempre. Os Curdos lutaram incessantemente pelo fim do domínio sobre a sua região, primeiro com o Império Otomano e depois com os Turcos. Mesmo apesar de o Tratado de Sévres em 1920 lhes ter concedido autonomia, nunca tiveram a sua região livre - toda e qualquer revolta Curda foi sempre suprimida pelo uso da força. Assim, após todos estes confrontos históricos, a existência de grupos étnicos, como os Curdos, na Turquia foi oficialmente negada e qualquer expressão de identidade étnica feita por este povo era duramente reprimida. Como prova disso, até 1991 o uso da língua curda - ainda que frequente - era ilegal.
Após reformas influenciadas pela União Europeia as transmissões de televisão e rádio em curdo foram permitidas embora com severas restrições de tempo e a educação em curdo agora é permitida embora apenas em instituições privadas.
Para Shahin, o maior exemplo da falta de respeito dos Turcos para com os Curdos foi o caso de Leyla Zana, em 1994! Leyla Zana, a primeira representante mulher curda no Parlamento da Turquia, foi acusada de fazer discursos separatistas aquando da tomada de posse como membro do parlamento. A Amnistia Internacional relatou que ela fez o juramento de lealdade em turco, como é exigido pela lei, e acrescentou então em curdo:
'Eu lutarei para que os povos turco e curdo vivam juntos em um sistema democrático'.
O Parlamento irrompeu com gritos:'Separatista!', 'Terrorista!', e 'Prendam-na!'. Foi então sentenciada a 15 anos de prisão.

Os conflitos entre os Curdos e os Turcos nunca foram ultrapassados e Shahin não acredita que existam grandes hipóteses de o relacionamento ser minimamente saudável. Há quem diga, e ela própria pensa que a entrada da Turquia na União Europeia foi impedida devido a estes confrontos e problemas do passado que vão persistindo no presente.
Foi então o momento de mudar novamente de país e, de espírito aberto a novas culturas, procurarem a liberdade.

Quando cheguei à Finlândia tinha cinco anos. As minhas memórias deste país são quase só positivas. Lembro-me que o meu irmão com apenas um aninho entrou de imediato no Jardim Infantil e logo toda a minha família começou a aprender o Finlandês. Tivemos um casal vizinho que foi muito simpático e nos ajudou muito no início, porque os meus pais não falavam finlandês.
A Finlândia é um belíssimo país para se viver. Se nós vivermos e entendermos a cultura finlandesa podemos quase compará-la à portuguesa: uma cultura de LIBERDADE! Claro que o povo finlandês não é tão quente como o português ou iraniano, e a noção de “colectividade” não é bem aceite. Acho, e é só minha opinião, que os Finlandeses são muito ambiciosos e a concorrência exacerbada existe, por exemplo, na educação e no mercado de trabalho.


Shahin acredita que os primeiros meses foram especialmente difíceis para os seus pais. Era Inverno quando se mudaram para este país do gelo e na Turquia estava um sol radiante. Além de que eles não falavam nada de finlandês! Tudo o que era comum entre o Irão, a Turquia e o povo Curdo, era considerado estranho na Finlândia, sendo disso exemplo, além da religião, coisas relativamente básicas como os próprios géneros alimentícios.

Apesar de vivermos na Finlândia, os meus pais nunca deixaram que eu e o meu irmão perdessemos e nos afastássemos das raízes iranianas nem do modo de vida islâmico, vivemos assim num mundo paralelo...Em casa, respeitamos o modo de vida islâmico, na rua vivemos o estilo europeu. Não é fácil sendo jovens, ultrapassar estes modos tão diferentes de encarar e viver a vida. Duas línguas, duas culturas, duas verdades...multi- experiências!
Na realidade, e para ser muito sincera, eu e o meu irmão já pouco vivemos segundo a lei islâmica. O único sítio onde evitamos comportamentos não aceites por esta religião é dentro da nossa própria casa. Evitamos essencialmente beber alcóol e eu uso a burka, isto somente para agradar o meu pai, porque a minha mãe, tal como eu, acha que devemos ser nós próprios a escolher o modo como queremos viver e seguir a nossa vida.


Shahin e o seu irmão tiveram de se unir para conseguirem adaptar-se a esta realidade tão diferente daquilo a que estavam habituados.

Tal como o meu irmão, a minha mãe é também a minha melhor amiga. Já o meu pai, posso dizer que apesar de todas as discordâncias e discussões (quase todas elas relacionadas com o modo de viver curd), é sem dúvida a âncora da minha vida, é a ele que recorro quando nada bate certo, quando nada parece fazer sentido e quando me sinto sem qualquer rumo.
Para mim, ser muçulmano não é viver de acordo com a lei islâmica, mas sim viver com Alá no pensamento e tentando respeitar os outros. É a filosofia de não fazer aos outros aquilo que não gostaria que me fizessem a mim. Sei que a maioria dos muçulmanos acha que deve viver a vida regida por uma série de leis do Corão que são um pouco rígidas, mas eu acredito que tentar melhorar o mundo através de um simples sorriso e com respeito pelo próximo, é suficiente para me fazer sentir uma pessoa feliz, bem como deixar felizes todos os que me rodeiam.


Regressar ao Irão esteve sempre na mente e as memórias não estavam tão longínquas quanto Shahin pensava.

A primeira vez que regressei ao Irão foi estranha... A maioria das coisas era diferente do que eu conhecia na Finlândia, mas curiosamente e apesar de ter saído muito nova do Irão, houve parentes meus que reconheci! E só a caminho da minha terra natal é que tomei consciência de que ela me era completamente desconhecida…e que afinal eu não tinha partilhado a minha vida com as minhas raízes – a minha família. Para ser sincera, esta constatação deixou-me triste. Até a sensação de usar a burka pela primeira vez no meu país natal foi muito gratificante, parecia que não estava em mim.
Tive a possibilidade de estar em contacto com as minhas origens e tomei consciência da pobreza e analfabetismo da população. Isto marcou-me bastante e levou-me a reflectir acerca da decisão dos meus pais ao terem procurado uma vida melhor para nós. Sei que graças a eles posso viver a liberdade que, garantidamente, ficando no Irão ou num país árabe, nunca teria tido acesso.

Claro que por vezes me vem à mente voltar atrás e começar tudo de novo no Irão, procurar novamente as minhas raízes, voltar a viver a minha vida de acordo com certas regras. Estão lá todos os meus parentes e uma série de coisas importantes na minha vida. Mas para ser honesta, neste momento essa ideia não é nem de perto nem de longe, realista. Mesmo que legalmente não exista qualquer problema em viver no Irão, tudo seria muito diferente. Simplesmente ainda não estou pronta! Mas como nunca sabemos o que nos poderá acontecer no futuro, quem sabe se não regressarei e lá passarei o resto dos meus dias?

Constituir família e a profissão de jornalismo estão no seu horizonte independentemente da sua morada no mundo.

Só posso dizer que nasci Curda e morrerei Curda.... É isso que Alá quer de mim e sei que esse é o meu destino!

[1] Os curdos são um grupo étnico que se considera como sendo nativo de uma região frequentemente referida como Curdistão, que inclui partes adjacentes de Irão, Iraque, Síria e Turquia. De acordo com a Encyclopaedia Kurdistanica, os curdos são descendentes de todos aqueles que tenham historicamente se fixado no Curdistão, e não de um grupo em particular.
[2]equivalente ao Dia de ano novo e celebra-se a 21 de Março

Saturday, March 14, 2009

A verdadeira essência de ...."isto"!

Lançaram-me um desafio: falar de algo! Mas de forma inovadora e criativa, com uma abordagem inédita.
Após largos minutos a pensar, cheguei à conclusão de que “isto” é essencial para as nossas vidas...
Sem “isto” não havia espaço para o erro, espaço para o gozo, espaço para aprender, espaço para sonhar e espaço para inventar! E até espaço para sujar!
Com “isto” podemos eliminar o passado, alterar o presente e lançar o futuro, recomeçando o nosso caminho...
Para “isto” poder funcionar, é a nossa mão que o pode comandar...Aliás, neste caso a nossa mão é a força divina e que faz “isto” mover-se.
Sem “isto” o mundo nunca poderia pular e avançar.... “Isto” é o que permite avanços e recuos, o entendimento e a compreensão, a melhoria e o passo em frente na vida de todos nós. Mas também permite rupturas, quebras e “azelhices”.
Todos estivemos nalgum momento em frente a “isto” e trememos. Esperávamos nunca ter que utilizá-lo…mas agora que olhamos para trás apercebemo-nos da sua importância...
Do que falamos??? Nada mais nada menos do que um “simples” apagador, um objecto que permite apagar...
É curioso que a palavra em si já diz muito...Apaga (dores), mas apaga também erros e brincadeiras que não queríamos que adultos vissem e eventualmente nos castigassem.
E agora, pensando bem....Será que damos a devida importância a um “simples” objecto e que parecia que em nada poderia afectar a nossa vida, mas que no entanto tinha a capacidade de nos tornar heróis ou não? Aqueles que não tinham de o utilizar eram adorados pelos adultos, invejados por algumas crianças e odiados por outras. Tudo isto num apagador!
E mesmo o dito “básico” apagador sobreviveu ao tempo... deixou de estar associado ao perigoso e velhinho giz para estar ligado à actual caneta. E aparece no computador em forma de tecla (o delete)!
Objecto impregnado de sonhos, (des)ilusões, pedagogia e inovação!
Aceitei o desafio... ousei ir mais além....vi o resultado e sinceramente gostei pois apercebi-me da importância de um “isto” nas “cenas” da nossa vida!